Tuesday, August 28, 2007

CASOS, CAUSOS & ACASOS

BICHO DO MATO

Descobri que sou (meio) bicho do mato, ou estou me tornando. Na cidade vou, volto, mas estou sempre me sentindo um estranho. Nem a herança de meus avós maternos, roceiros vindos de Catas Altas para Major Ezequiel (Fazenda das Pacas) depois para o(s) Gomes do Prata (Fazenda do Vai-e-Vem) até então não havia feito de mim um bicho do mato. Mas agora... Desaprendi a viver no meio da multidão, nem vou mais ao Mineirão. Praia apertada, saltar entre as toalhas estendidas, tomar bolada de frescobol ou levar uma trombada de um jogador de peteca, não tem sido mais a minha onda. De novidades eletrocosmogônicas (seria isso mesmo?...) Celular, fax, computador, Ipod, mp3 ou 4 (já tem 5?), play station, www e email não sei nada. E restaurante?... Quanto mais vazio, melhor; é uma dificuldade para achar mesa e ser atendido, um alívio quando consigo pagar a conta.

Não sou mesmo bicho do mato?

Novela? Só aquelas que têm paisagens, o verde da natureza, animais; se for dentro de apartamento, com trama de traição, o personagem fica “rico” ou pobre” num piscar de olhos, dissimulação e o valor material acima do espiritual. Tô fora.

E o trânsito?

Aquela confusão, palavrões, placas para todo lado e a pressa para o inadiável compromisso com o nada, Deus me livre!

Parece que tenho origem indígena para venerar tanto a natureza. Fico meio sem graça quando a conversa é sobre sexo (não sou moderno então?), se durante uma celebração religiosa na hora da confraternização tenho que abraçar o irmão do lado, que timidez! Tem hora que gostaria de ser invisível. Compras em supermercado lotado? Fujo...

Acho que com todo esforço, ainda sou mesmo um conservador, muito tímido, principalmente se tenho que perguntar a alguém onde fica o banheiro (?).

Gosto de frases de efeito, livros, textos, revistas (principalmente as mais velhas), não leio cardápio, mas infelizmente leio bula de remédio.


Não tenho pedigree, sou mesmo cachorro do mato !


Wednesday, July 11, 2007

CASOS, CAUSOS & ACASOS



UM HOMEM SEM PIEDADE

O sobrinho Carlos Augusto brindou-nos com a sua estréia no "Jornal Estado de Minas" em 10 de julho de 2007, exatamente quando o seu avô faria 84 anos. É assim a vida. O vovô era um leitor assíduo do Estado de Minas e certamente, lá no céu, ficou feliz por você. Parabéns!!! Tio Petrônio.




“Filho da p...!!!”, gritou para o rapaz que corria. “Pega ladrão, pega ladrão!”. Ninguém parecia se importar. É assim: cada um com seus problemas. Antes ele do que eu. “Sr. guarda, roubaram minha carteira”. Ele também parecia não se importar. Acontece todo dia, toda hora. Certo? Certo. Já é algo comum. Só mais um pobre coitado que perdeu suas economias e, de lambuja, todos os documentos. Fazer segunda via de todos os documentos é muito chato.
“Para onde ele correu?”, perguntou o policial. “Pra lá”, respondeu eufórico o homem, apontando a direção. “Hum...”, resmungou o policial, enquanto passava a mão no queixo. “Você não vai fazer nada?”. “Agora, já é tarde. Ele deve estar longe.” “Mas...” E o homem, desolado, não pôde evitar sua expressão de surpresa e de desamparo com a situação.
Que coisa, não? E acontece todo dia, toda hora. Não é mesmo? Inconformado, mas sem mais nada a fazer, a vítima foi embora. E agora? Ia chegar de mãos vazias em casa? Deveria estar fazendo compras nesse momento. Leite, pão, manteiga... não tinha nada para comer. E, ainda por cima, tinha seis bocas para sustentar. O desespero começou a tomá-lo de súbito. No ponto do ônibus, lembrou que não tinha dinheiro nem para a passagem. Pôs as mãos sobre a cabeça e seus olhos começaram a lacrimejar. Homem não chora! Encostou-se em um muro e ficou a pensar.
Peão de obra que era, Severino acabara de ganhar seu ordenado. Era todo o dinheiro do mês. Sua mulher era lavadeira, mas não ganhava bem. Seus cinco filhos eram novos demais. O mais velho tinha apenas 12 anos. Todos dependiam dele. Não poderia falhar. De jeito nenhum.
Mas acontece todo dia, toda hora. Certo? Certo. Então, o que fazer? Não poderia se dar por vencido. Precisava tomar alguma atitude, pedir ajuda, deixar o orgulho de lado. Resolveu, então, apelar para a bondade alheia. Bondade? Mas que bondade, santo homem de Deus?
“Meu senhor, sou um homem trabalhador, pai de cinco filhos. Acabei de receber meu pequeno salário. Contudo fui assaltado naquela esquina. Preciso comprar o leite das crianças. Será que o senhor não poderia me dar uma ajuda?” E as respostas que se seguiram pareciam combinadas e ensaiadas anteriormente: “Já ouvi essa. Não vou dar porcaria nenhuma”, “Vai trabalhar, vagabundo”, “Não tenho”, “Fica aí pedindo, em vez de arrumar um emprego”, “Não”, “Não, não e não!”.
O que é isso? Nenhuma boa alma para ajudar? É sempre assim. Ele próprio sentia certa dificuldade de acreditar nas histórias dos pedintes de rua. Acontece todo dia, toda hora. Certo? Certo. Então, o que fazer? Seu último plano falhara. Último? Sempre existe uma saída, a última, a dos desesperados. E, naquele momento, ele compreendeu. De quem era a culpa? Não era sua, certamente. Culparia, pois, o primeiro “filho da mãe” que ali passasse. Então, munido de um pedaço de vidro que achara no chão, pronunciou-se em alto e bom som: “Passa a grana. Quero tudo: relógio, carteira, pulseira, colar, o que tiver. E passa logo ou eu te furo”.
Ficara bom naquilo. Nem parecia ser a primeira vez. E já não era mais. Era a terceira, quinta, 10ª. E, antes que percebesse, se transformara naquilo. Um homem sem piedade. Daqueles que roubam o salário inteiro de um trabalhador que acabou de recebê-lo. É assim mesmo. Acontece todo dia, toda hora. Certo?

Carlos Augusto de Moura Castro
Jornalista e Publicitário