Antes de ir desta para melhor, vou dar com a língua nos dentes e lavar roupa suja. Com a faca e o queijo na mão, com uma perna às costas e de olhos fechados, vou sacudir a água do capote. Ainda tirei o cavalinho da chuva, tentei riscar este assunto do mapa, mas eu sou uma troca-tintas, uma vira casacas e vou voltar à vaca fria.
Andava eu a brincar aqui com os meus
botões, a chorar sobre o leite derramado, com bicho carpinteiro e macaquinhos
na cabeça, quando decidi procurar uma agulha no palheiro. Eu sei, eu não bato
bem da bola, mas sentia-me pior que uma lesma e tinha uma pedra no sapato. O
problema é que andava a bater com a cabeça nas paredes há algum tempo, com um
aperto no coração e uma enorme vontade de arrancar cabelos.
Passei muitos dias com cara de caso e
com a cabeça nas nuvens como uma barata tonta. Mas eu, que sou armada até aos
dentes, arregacei as mangas e procurei o arquivo a eito. Acontece que uma vez
em conversa com um amigo ele disse-me «Tiras-me do sério» e eu, sem papas na
língua, respondi «Se te tiro do sério, deixo-te a rir, é isso?».
Ele, de trombas e com os azeites,
gritou em plenos pulmões «Esquece Mafalda, escreves belissimamente mas não
conheces nem 1/4 das expressões portuguesas.»
Só faltou trepar paredes. É preciso
ter lata! O primeiro milho é dos pardais. Primeiro pensei ter posto a pata na
poça, depois achei que ele tinha acordado com os pés de fora e que estava a
fazer uma tempestade num copo d´água e trinta por uma linha. Fiz vista grossa,
mas depressa disse Ó tio! Ó tio!
Abri-lhe o coração, o jogo e os olhos
na esperança de acertar agulhas e pôr os pontos nos is. Não lhe ia prometer
mundos e fundos nem pregar uma peta, eu estava mesmo a brincar. Era um
trocadilho. Pão, pão, queijo, queijo. Rebeubéu, pardais ao ninho, fiquei com os
pés para a cova, só me apeteceu pendurar as botas e mandá-lo pentear macacos,
dar uma volta ao bilhar grande ou chatear o Camões.
Que balde de água fria! Caraças,
levei a peito, aquela resposta era tão sem pés nem cabeça que fui aos arames.
Eu sei que dou muitas calinadas, meto os pés pelas mãos e faço tudo à balda.
Posso até ser uma cabeça de alho chocho e andar sempre com a cabeça nas nuvens
mas não ia meter o rabo entre as pernas nem que a vaca tossisse.
Pus a cabeça em água e fiquei a
pensar na morte da bezerra. Caí das nuvens e com paninhos quentes passei a
conversa a pente fino, não fosse bater as botas. Percebi que ele tinha trocado
alhos por bugalhos, apeteceu-me cortar-lhe as asas, mas estava de mãos atadas
e baixei a bola. Engoli o sapo, agarrei com unhas e dentes, dei o braço a
torcer e dei-lhe troco com o intuito de descalçar a bota.
Não gosto muito do vira o disco e
toca o mesmo, mas isto já são muitos anos a virar frangos e pus as barbas de
molho. Uma mão lava à outra e as duas lavam as orelhas, mas ele está-se nas
tintas, à sombra da bananeira. Não deu uma mãozinha nem deixou-se comprar gato
por lebre. Ficou com a pulga atrás da orelha, pôs-se a pau antes de estar feito
ao bife.
Pus mãos à obra, tentei fazer um
negócio da China e bati na mesma tecla. Dados lançados, cartas na mesa, coisas
do arco da velha. Claro que dei com o nariz na porta, o gato comeu-lhe e língua
e saiu com pés de lã. Água pela barba! Devia aproveitar a boleia antes de ficar
para tia de pedra e cal onde Judas perdeu as botas.
É que isto pode estar giro e estar
fixo, mas não me apetece segurar a vela com dor de corno e dor de cotovelo só
porque não conheço 1/4 das expressões portuguesas.
MAFALDA SARAIVA
Foto: José Coelho/Lusa.
Partilhado por: «O SALOIO» – Mafra. |
25/01/2024.