Há pouco mais de um mês conheci um homem, um paciente sendo mais precisa. Um homem de caráter, um homem justo, um pai amoroso a sua maneira, um ótimo marido. Um pouco bravo, diga-se de passagem. Eu sei que para os irmãos, por circunstâncias e perdas ao longo da vida, ele se tornou uma referência. Sei que levava a família para a praia no passado, todos os anos. Sei que criou três filhos que se tornaram seres humanos de bem para este mundo caótico. Um homem forte e de forte opinião. Eu o conheci assim, e com ainda mais detalhes e histórias. Mas esse relato aqui carrega um fato curioso: eu nunca ouvi a voz dele. Poucas vezes ele me olhou nos olhos e, quando sim, foi num lapso, rapidamente. Eu o toquei e em raríssimos momentos tive retribuição. Mesmo assim, acreditem, eu o vi em pé, falando e olhando quando nem mesmo estava acordado. Esse é o poder do amor: é quando os nossos, sejam amores ou amigos, são capazes de trazer com palavras forma e fôlego mesmo depois que o nosso relógio já está errando os segundos. Contam sobre nós usando todas as tintas disponíveis da aquarela, misturam e ainda criam cores novas. E assim, não há outra saída: quando tocamos o outro tão profundamente a este ponto, meu amigo...morrer é impossível. Isso me lembra uma frase de um poeta inglês, por acaso médico pediatra, que diz: "quando a morte me encontrar quero estar bem vivo". Na época em que a descobri fiquei encantada, pensei até em tatua-la na pele. Hoje eu sei: eu não a entendia por completo. Agora sim, entendo. Obrigada.
Um abraço, Mariélly.
Mensagem a Doutora Mariélly Borim:
Nós irmãos do paciente da autora, silencioso mentor de nossas vidas, agradecemos a elegância do gesto: Imaculada, João Bosco, Gorett, Edmar, Leonor e Petrônio.