A vida de todo homem normal é regida por um duplo psiquismo:
o psiquismo inferior ou temperamental e o psiquismo superior ou
caracterológico.
Ao primeiro está ligado o temperamento, cujas bases repousam
no lastro sensitivo-afetivo do indivíduo. Ao segundo está ligado o caráter que
se estrutura nas forças intelecto-volitivas.
O temperamento é inato, visto que depende de nossa natureza
fisiológica, e está regido pelo determinismo biológico dinâmico-humoral, ao
passo que o caráter, se bem que se estribe no temperamento, pois nada vem ao
intelecto sem ter antes passado pelos sentidos, se elabora na liberdade da
vontade.
As glândulas de secreção internas têm papel importantíssimo
no estudo do temperamento, pois, se “o vinho alegra o coração do homem”, nada
mais lógico que um pouco de adrenalina possa influenciar no estado afetivo do
indivíduo.
Assim se encontrou
álcool no sangue do beberrão, a saliva do colérico acusou a presença de
ptomaínas.
Do outro lado, “o que faz o caráter propriamente dito é,
antes de tudo, a energia da vontade”.
É de Santo Agostinho esta frase de expressivo valor
psicológico: “Homines sunt voluntates”. Sim, o homem é a vontade. Não quer
dizer, aqui o mestre, da exclusividade da vontade. Nesse caso, queremos ver a
vontade palmilhando o caminho que iluminou a inteligência quando estabeleceu a
rota de sua companheira.
Resumindo, convém diferenciar o temperamento do caráter,
muito embora sejam elementos que se completam.
Uma das facetas importantes do temperamento é a sua
intransferibilidade. Ao longo de toda a
vida, salvo em casos de doença, o temperamento permanece inalterável.
Os maiores costumavam dizer, com muita sabedoria, que, se
expulsássemos a natureza, esta voltaria a galope. O colérico morrerá colérico e
melancólico será preso na tristeza a vida inteira.
Como o corcel fogoso, ele tem necessidade constante de
rédeas que lhe controlem o ímpeto. E como o manso foi doméstico, do aguilhão
que lhe acelere o passo.
Determinado pelos elementos somáticos, o temperamento carece
de moralidade. Não há maus nem bons temperamentos. O covarde como o colérico só
são dignos de vitupério por não terem sabido, por meio de uma vontade
esclarecida, aproveitar-se da mansidão ou da cólera.
O temperamento, sendo um modo de sentir, é tão próprio do
homem como é para o animal, enquanto o caráter é o pedestal onde se eleva a
personalidade humana.
Agir temperamentalmente é ter lugar comum com o irracional –
todavia, agir com caráter é agir como verdadeiro homem.